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Marcelo Freixo: ‘A minha insegurança é o preço da inoperância do governo do estado’


Alvo de 27 ameaças de morte –sete delas só no último mês–, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ), 44 anos, saiu do Brasil no início da noite desta terça-feira 1º, desconcertado e às pressas, segundo deixou entrever em conversa com Carta Capital duas horas antes de tomar o avião rumo à Europa (o país de destino está sendo mantido em sigilo por razões de segurança). “O governo do estado veio com uma nota no dia de ontem dizendo que as ameaças não têm fundamento, mas que não falaram nada por sigilo. Sigilo para mim? Nem eu sabia! Que sigilo é esse?”

A convite da Anistia Internacional e da organização de direitos humanos Front Line, o parlamentar que presidiu a CPI das Milícias há dois anos e é pré-candidato à Prefeitura do Rio, sai por um mês “do circuito” e, no exterior, tem o objetivo de aumentar a pressão internacional sobre o Brasil para que se combata o problema no estado. “Não vou deixar que façam o mesmo que ocorreu com a Patrícia (Acioli, juíza assassinada em agosto, em Niterói).”

Carta Capital – O sr. sai por não se sentir seguro com as condições de proteção oferecidas?

Marcelo Freixo – O grande debate não é sobre a minha segurança. Eu tenho uma segurança que a maioria da população não tem. O grande debate é o enfrentamento das milícias. Eu estou saindo para fazer uma denúncia porque das 58 propostas concretas que aprovamos no relatório da CPI quase nada saiu do papel. O número de milícias em 2008 era de 170, hoje é de mais de 300. Já torturaram jornalistas, já mataram uma juíza e agora ameaçam a vida de um parlamentar. Tivemos 500 prisões depois da CPI, isso é muito importante, mas só as prisões não resolvem, tem que tirar deles o braço econômico e territorial. Nada é feito e há um cinismo no Rio de Janeiro, em que se finge que o problema das milícias está resolvido. Eu não posso continuar convivendo com essas ameaças como se a milícia fosse um problema só meu. Não é. Esse é um problema do Rio de Janeiro.

CC – Mas que atinge o sr. diretamente…

MF – A minha queixa não é em relação a segurança, é quanto à falta de comunicação da Secretaria de Segurança ou de qualquer pessoa do governo quanto a essas ameaças. Ninguém me procurou para dizer qual apuração foi feita, e aí o governo do estado vem com uma nota no dia de ontem dizendo que as ameaças não têm fundamento, mas que não falaram nada por sigilo. Sigilo para mim? Nem eu sabia! Que sigilo é esse?

Carta – De acordo com a Secretaria de Segurança do Rio, o sr. é o parlamentar mais protegido do Rio de Janeiro…

Freixo – O governo me protege porque tem obrigação de fazer isso, porque estou ameaçado por conta da minha função pública. Não é favor. Estou ameaçado porque eles não fizeram o que deviam fazer, não cumpriram o que o relatório da CPI determinou. A minha insegurança é o preço da inoperância deles. Não é bom viver com segurança, não é privilégio. Eu troco. Quem quiser trocar (de lugar comigo), eu troco. E mais do que isso, não estou discutindo segurança. Estou discutindo por que, em nenhum momento, eles entraram em contato comigo para falar que investigação estava sendo feita. Sabe por quê? Porque não fizeram investigações. Duvido. Assim como não fizeram investigações sobre (as denúncias do) disque-denúncia da Patrícia (Acioli). Porque se tivessem feito, ela estava viva. Desconsideraram o disque-denúncia da Patrícia, o que não vou deixar que façam… A milícia usou as armas do Estado, da polícia, para matar a Patrícia. Deram um recado: estão calando o Estado. É isso que eles querem. A minha saída do Brasil é uma forma de protesto. Estou saindo porque recebi sete ameaças em um mês, porque não recebi um comunicado do Estado e porque a situação das milícias se agrava a cada dia no Rio de Janeiro, e a minha ida para lá gerou um debate. Se alguém acha que a minha segurança é muito grande, devia comparar com a segurança do sr. Luiz Zveiter, presidente do TRE (RJ). Não existem essas ameaças sobre ele, mas a segurança dele é cinco vezes maior que a minha. Estou denunciando uma situação grave, de uma milícia estabelecida no Rio de Janeiro e em outros lugares do Brasil, as providências não são tomadas, o Estado sabe o que fazer, e essa pressão na esfera internacional tem que acontecer para que a pressão sobre o Estado brasileiro aconteça.

CC – O que vai fazer na Europa?

Freixo – Como tudo foi feito em cima da hora –o convite foi feito de quinta para sexta–, é uma situação muito mais emergencial que planejada, vou cumprir a agenda que a Anistia conseguir lá. Vou levar alguns relatórios da CPI e vamos conversar para que a pressão sobre o governo brasileiro no sentido de cumprir o relatório possa acontecer, porque é necessário. O objetivo da Anistia é me tirar um pouco do circuito neste momento, até que se possa restabelecer minha segurança em função dessa nova conjuntura, porque sete ameaças em um mês é algo muito delicado. Também vou buscar evidentemente um equilíbrio para continuar fazendo esse trabalho e aproveitar isso para trazer para dentro do Brasil a denúncia de que as coisas não estão resolvidas. E lá fora pedir para que a comunidade internacional pressione o país, já que o Brasil vai ser palco de grandes eventos internacionais. Que essa comunidade que em breve vai estar olhando para o Rio de Janeiro, que olhe logo agora e perceba que existe uma máfia muito bem estabelecida aqui ameaçando o poder público.

Carta – Para esclarecer: o sr. pediu aumento de sua segurança pessoal ao governo do Estado, e esse reforço não chegou a tempo. É isso? O governo nega.

Freixo – Eu pedi mais um policial em agosto, até agora não chegou. Eu tenho o ofício. O secretário de segurança me parece até que desconhece, mas tenho o ofício desde agosto, e reiteradas vezes, esse ofício tramitou mais de cinco vezes para a secretaria. Realmente existiu esse pedido em agosto e não foi atendido até agora, mas é muito mais por um processo burocrático. Mas minha saída não é em função disso, por causa de um policial a mais ou a menos. Acontece por conta do acirramento das denúncias, da falta de respostas da secretaria para todas as denúncias e do convite da Anistia para poder fazer essa denúncia tanto aqui dentro como lá fora.

Entrevista concedida a Carta Capital.
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