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As raízes profundas dos protestos, por Carlos Chagas


Por Carlos Chagas
Acima e além dos protestos contra o aumento de 20 centavos nas tarifas dos transportes coletivos, as manifestações nas ruas de São Paulo, Rio e outras capitais exprimem a frustração da juventude. Porque dificilmente se tem visto algum cidadão com mais de trinta anos desfilando pelas ruas. Fora aquele percentual mínimo de baderneiros empenhados em depredar vitrinas e em destruir e emporcalhar patrimônio público e privado, a grande maioria dos manifestantes parece provir da classe média. Os 20 centavos exprimem um símbolo, mas, na realidade, os jovens insurgem-se contra o modelo político, econômico e social que assola o país. Não se vê, nessas passeatas explosivas, representantes das classes menos favorecidas, fregueses do bolsa-família ou, mesmo, trabalhadores egressos da miséria, hoje felizes por haverem mudado de patamar, tornando-se consumidores. Nem os pimpolhos das elites privilegiadas.

Os governos de Dilma, de Geraldo Alckmin, de Sérgio Cabral e outros estão recebendo um recado, ainda que ninguém grite “abaixo o PT”, “abaixo o PSDB” ou “abaixo o PMDB”. Parte da população insurge-se contra as precárias estruturas da educação, da saúde, da habitação, claro que dos transportes coletivos também, mas, em especial, contra a falta de meios para enfrentar e modificar o futuro.

Quem assistiu a reação da juventude nos idos de 1968 percebe a diferença de situações. Milhares de estudantes, em perfeita ordem, quase unida, marcharam pelas avenidas gritando “abaixo a ditadura”. Lá, como cá, a polícia fazia horrores, mas como estamos na democracia, anula-se o denominador comum que unia os manifestantes. Hoje, o protesto não se limita aos 20 centavos de aumento no preço das passagens de ônibus e metrô. Deve-se à carência de melhores condições de vida dos moços. Por certo que entram na equação outros fatores, como a vontade de participação no processo político e a inclinação pelo inusitado. Não são rebeldes sem causa. Sentem-se oprimidos como seus pais se sentiam, não mais pelo regime militar, hoje, mas por uma sociedade igualmente perversa para com a classe média.

Baderneiros infiltrados no movimento distorcem seu sentido que seria justo se não fosse prejudicial à ordem pública. É preciso prestar atenção. Haverá desdobramentos. Fica ridículo assistir a união dos contrários, tucanos como o governador Alckmin e companheiros como o prefeito Haddad, atribuindo tudo à irresponsabilidade dos jovens ou à orquestração encenada por adversários radicais. O fenômeno das duas últimas semanas tem raízes bem mais profundas. Poderá esvaziar-se, como é natural em toda explosão, principalmente se a polícia recolher-se apenas à guarda de propriedades públicas e privadas.
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