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Lula e o fogo amigo

Zuenir Ventura Foto: O Globo

Por Zuenir Ventura, de O Globo
 
Parece até que Lula está em campanha. E, vai ver, está mesmo. Se estiver, deu esta semana os primeiros passos nessa direção, ao se descolar de Dilma e do PT que aí está, por meio de um discurso que lembra um candidato oposicionista de esquerda. Será alguém saltando do barco enquanto é tempo, para um dia poder voltar? Da presidente, ele disse coisas que só se costuma ouvir da boca de adversários, nem isso. Por exemplo: comparou-se a si e a ela a um “volume morto”. Foi tão duro que deve estar sendo difícil saber qual rejeição a está fazendo sofrer mais, se a dos eleitores (65%) ou a do seu criador.

Falando no seu instituto para um público de padres e dirigentes religiosos, o ex-presidente contou que fez a seguinte pergunta a Dilma: “Companheira, você lembra qual foi a última notícia boa que demos?”. Ela não teria sabido responder, mas ele se lembrava de todas as más, que enumerou: inflação; aumento da conta de água, que dobrou; e de luz, que para algumas pessoas triplicou; da gasolina; do diesel; do dólar; das denúncias de corrupção da Lava-Jato. Não faltou a promessa de que não mexeria em direitos trabalhistas “nem que a vaca tussa”.

No seu segundo seminário, com a presença do ex-primeiro-ministro espanhol Felipe González, ele escolheu como alvo o partido, com a seguinte confissão: “A gente acreditava em sonhos. Hoje a gente só pensa em cargo, em emprego. O partido perdeu a utopia”. Deve ter sido muito desagradável para os petistas ouvirem o líder dando razão a Garotinho, que um dia apelidou o PT de “partido da boquinha”.

Na verdade, se Dilma está irritada com as críticas, como informam os mais próximos, Lula anda preocupado também por não ter foro privilegiado, ou seja, não ser julgado pelo STF, o que o deixa sujeito a ser chamado a depor a qualquer momento. Ele já disse que a detenção na sexta-feira dos presidentes das empreiteiras é um sinal de que o próximo alvo da Lava-Jato é ele, talvez pensando no que Emílio Odebrecht, pai de Marcelo, que está preso, e criador da maior construtora da América Latina, teria repetido em várias ocasiões — que se o filho fosse para a cadeia, seriam precisas outras três acomodações: “Uma para mim, outra para o Lula e outra ainda para a Dilma”. Pode ter sido pura ameaça, mas, por via das dúvidas, a cúpula do PT está em estado de alerta. Se em Curitiba tem gente que não está dormindo direito por causa do frio e do desconforto das celas, em outros lugares a Lava-Jato tira o sono por causa da perspectiva de prisão. Isso é uma novidade num país em que, como se dizia, isso só acontecia com preto, pobre e prostituta.




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